Só 11% das obras do PAC em estados e prefeituras já foram licitados

As obras do novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) do governo Lula com verba enviada a estados e municípios estão praticamente paradas até agora.
Dos R$ 48,8 bilhões em instrumentos firmados com entes da federação para obras de infraestrutura desde 2023, quando o programa começou, só 11,4%, R$ 5,5 bilhões, foram licitados, segundo dados do TransfereGov, sistema do governo federal.
Os demais R$ 44 bilhões ainda não saíram do papel. São obras de transporte público em grandes cidades, saneamento, drenagem, construção de escolas e hospitais, pavimentação e requalificação de espaços públicos, entre outros investimentos.
Ao todo, o governo empenhou (reservou para pagamento) R$ 62,6 bilhões em 2023 e 2024 no novo PAC. Uma parte é usada diretamente pelo governo federal, e outra é distribuída aos estados e municípios nesses acordos.
Uma proposta para reformar o aeroporto de Maringá, por exemplo, foi assinada em dezembro de 2023 e prevê um investimento federal de R$ 118 milhões, mas ainda não houve licitação da prefeitura para escolher a empresa responsável.
Procurada, a Prefeitura de Maringá disse que o projeto está em fase final de ajustes e aprovação na Secretaria Nacional de Aviação Civil, responsável pela liberação das obras, e que a licitação está prevista para setembro deste ano.
A construção de uma adutora em Campina Grande (PB), proposta de fevereiro do ano passado, tampouco começou. A previsão é gastar R$ 192 milhões, mas o cronograma da obra está "pendente de ajustes". O governo da Paraíba não respondeu sobre o projeto.
Das 72 obras com orçamento acima de R$ 100 milhões, apenas 12 tiveram suas licitações concluídas, ou seja, estão em condições de realmente começar.
Enquanto isso, o governo federal tenta agilizar os investimentos do PAC executados pela própria União, entregando unidades básicas de saúde indígena, fazendo obras de saneamento e reformando universidades federais, por exemplo.
Procurada pelo UOL, a Casa Civil, que é responsável pela execução do PAC, disse que a "quase totalidade" dos gestores municipais e estaduais entregou a documentação devida até o prazo, entre abril e maio desse ano.
Desses, "66% estão aptos a licitar ou estão com as obras em execução, incluindo aquelas da saúde e de educação".
O UOL procurou os ministérios onde há orçamento do PAC parado e questionou se, onde a documentação já foi aprovada, houve a autorização para que sejam feitas as licitações — ou seja, se a responsabilidade pela demora era do Executivo federal ou dos entes federados.
Os ministérios destacaram que é preciso passar por um procedimento no governo federal, mas também que há obras que estão prontas para serem licitadas e ainda não foram (leia mais abaixo).
Diretor do IFI (Instituição Fiscal Independente) do Senado, o ex-deputado federal Marcus Pestana ressalta os desafios para tirar as obras do papel. "Primeiro, o município tem que estar com a documentação em dia. Muitos estão inadimplentes. Depois, tem o projeto de engenharia e arquitetura e o licenciamento ambiental. O grau de eficiência é muito variado (em diferentes cidades)."
Contratos de infraestrutura costumam durar pelo menos um ano. No ritmo atual, é improvável que muitas dessas obras de estados e municípios fiquem prontas antes das eleições de 2026, o que deve diminuir o impacto eleitoral do programa.
Há uma dificuldade adicional. Gastos previstos no Orçamento de um ano não podem ser mantidos indefinidamente nos anos seguintes. Embora o Congresso costume prorrogar alguns prazos, há um limite de um ano para pagar os "restos".
"Os países asiáticos em média investem 35% do PIB. O Brasil está investindo 17%, menor patamar da história. E além disso, há um problema de execução"
Marcus Pestana, diretor do Instituto Fiscal Independente do Senado
As prefeituras e estados têm um prazo, após assinarem o termo de compromisso com a União, para apresentarem a documentação do projeto. Até agora, no TransfereGov, a documentação já consta como entregue para 2.788 projetos, que equivalem a R$ 28,2 bilhões.
A partir do momento em que a documentação é aprovada, cabe ao ministério dar o aval para que a licitação seja realizada. A aprovação aconteceu em 76% dos projetos que apresentaram a papelada necessária.
Outro lado
Com um recorte diferente daquele usado pela reportagem, a Casa Civil contabiliza R$ 46,5 bilhões em propostas do PAC com recursos da União, o que representa 7.940 termos de compromisso assinados com estados e municípios.
"Destes, estão aptos para licitar 2.794 (35,19%), que corresponde a R$ 16,4 bilhões. Estão com licitação concluída e verificada 1.290 (16,25%), R$ 2,8 bilhões. Estão em execução ou concluídos 1.905 (23,99%), R$ 3 bilhões. Os outros encontram-se em etapa preparatória."
O Ministério da Saúde afirmou que a maior parte das suas obras do PAC é viabilizada por transferências fundo a fundo, uma modalidade diferente daquela que trata essa reportagem, na qual 82% das obras já tiveram edital publicado ou estão em fase de execução.
"No eixo Saúde do Novo PAC, a maior parte das obras é financiada por transferências fundo a fundo — modalidade em que 82% das obras já tiveram edital de licitação publicado ou estão em execução — e não exige autorização prévia do ministério para o início da licitação. Isso representa 1.738 projetos."
"Considerando o total de 2.231 projetos aprovados no eixo Saúde de entes subnacionais (estados, municípios e entidades governamentais destes entes), 1.754 projetos (78%) já tiveram edital de licitação publicado ou estão com as obras em execução, com R$ 5,9 bilhões empenhados — o que corresponde a 47% do valor total dessas obras."
"Das 477 obras ainda não licitadas, 104 são executadas via Caixa e dependem da atuação dos estados e municípios para a retirada de cláusulas suspensivas e o início do processo licitatório. As outras 373 são fundo a fundo e não exigem autorização do Ministério da Saúde para serem licitadas."
No modelo executado via Caixa, há 120 projetos aprovados. São obras de grande complexidade — como hospitais, maternidades e policlínicas.
O Ministério da Cultura informou que celebrou, em 2024, 195 termos de compromisso para implantação de CEUs da Cultura, para implementar equipamentos públicos culturais. Desses, 40 já tiveram autorização para iniciar a licitação.
"O Ministério da Cultura tem apoiado estados e municípios para que a implantação desses empreendimentos ocorra com a maior celeridade possível, observando as legislações aplicáveis", disse a pasta ao UOL.
O Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional afirmou que o trâmite dos projetos envolve a aprovação do plano de trabalho, a formalização do instrumento de repasse, a liberação dos recursos e o acompanhamento técnico.
O Ministério dos Portos e Aeroportos respondeu sobre a demora na licitação do aeroporto de Maringá.
"O empreendimento vem sendo acompanhado pelo Ministério de Portos e Aeroportos (MPor) desde 2021, ainda na fase de anteprojeto. O cronograma previa quatro entregas parciais progressivas. Em setembro de 2024, quando venceu o prazo para cumprimento da cláusula suspensiva, a última entrega — o projeto básico completo — já estava em sua quinta revisão."
"O projeto encontra-se agora em processo de revisão por parte do município. (...) Destaca-se ainda que houve mudança de gestão municipal, e a nova administração optou por realizar ajustes no projeto. (...)A expectativa do município é concluir esse processo a tempo de iniciar a licitação ainda em 2025."
Não houve resposta das demais pastas até a publicação deste texto.
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