Wálter Maierovitch

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Opinião

O dilema de Trump: colocar ou não os EUA no conflito Israel x Irã

O mercurial e contraditório presidente americano Donald Trump vive um dilema: colocar ou não os EUA no conflito entre Israel e Irã.

Trump está envolto, como dizem os criminalistas, numa camisa de sete varas. O dilema deve-se ao fato de o líder supremo da teocracia iraniana, Ali Khamenei (86 anos de vida e 36 de poder), ter dado, como se diz no popular, "uma banana" ao ultimato de Trump.

O líder iraniano não jogou a toalha e prometeu promover danos irreparáveis caso o Irã seja atacado pelos EUA. No momento, a bola está no campo de Trump, que até já reuniu o Conselho de Defesa.

A lembrar: Trump elegeu-se prometendo a paz e dizendo que atuaria na solução rápida dos conflitos em curso — Ucrânia x Rússia e Israel x Hamas.

Trump, politicamente, sabe da divisão que enfrenta. O movimento trumpista conhecido pela abreviatura MAGA (Make America Great Again), atuante dentro do Partido Republicano, está rachado.

Nesse racha, há os que ainda pregam o belicismo — a apelidada doutrina Neon de intromissões, como aconteceu no Iraque, Afeganistão e Líbia. Do lado oposto, com vozes de respeito interno como as de Steve Bannon e Tucker Carlson, estão os que não querem guerra de jeito algum, mantida a posição ao tempo das eleições.

Trump, nessa sinuca de bico que se meteu, terá de se posicionar. Ele é sabedor, pelo menos, de poder manobrar o ególatra Benjamin Netanyahu, primeiro-ministro que se insinua, modéstia de lado, o maior estrategista da história de Israel e do povo hebreu.

Não é bem assim, pois Israel precisa do apoio americano. Caso contrário, não resistirá à guerra com o Irã, sem ignorar que possui frentes de combate abertas na faixa geográfica de Gaza e na fronteira com o Líbano — onde o Hezbollah continua, com bombas, a colocar em risco os agricultores israelenses.

Para se ter ideia da dependência, e como informaram as agências internacionais de notícias, o estoque israelenses de mísseis de modelo Arrow, utilizados para interceptar os mísseis iranianos, já está baixo. Somente 5% dos mísseis iranianos conseguem furar o sistema de escudo de Israel, que emprega os mísseis Arrow. Isso significa uma necessidade de manutenção do escudo protetor.

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Atenção: para tentar furar o "escudo" usado por Israel, o Irã anunciou, como propaganda de guerra e pelas suas mídias, o uso de mísseis hipersônicos.

Aliás, pelo que noticiam as mídias internas controlados pela ditadura teocrática, o cidadão iraniano imagina que o Irã está vencendo a guerra com facilidade e os líderes mortos caíram em combate. Quanto à rede televisiva, acabou atingida por uma mera distração.

Tem mais: a central nuclear de Fordow — que funcionaria para enriquecimento de urânio igual ou acima de 60% de potência — é subterrânea, com 90 metros de profundidade. Ou seja, apenas bombas penetrantes e pesadas conseguiriam chegar ao coração da Fordow, e só os americanos produzem bombas de tonelagem.

Passo a passo do conflito

Quando do início do conflito, na sexta-feira (13), Trump foi logo avisando da não participação americana na ofensiva de Israel. Deixou claro que o aliado Estado da estrela de Davi seria protegido apenas defensivamente.

Na ocasião, Trump estava engasgado com o insucesso do acordo nuclear, por não ter o Irã aceito a proposta de encerrar o enriquecimento do urânio e estar a transformá-lo em combustível para armamentos de guerra, como artefatos e bombas nucleares. Trump deu o prazo de 61 dias para a volta às negociações.

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Terminado sem resposta o prazo, Israel realizou o primeiro ataque no dia seguinte.

Trump, a partir daí e da vantagem inicial de Israel, começou a tomar partido e querer dividir as vitórias com o sanguinário premiê israelense, Benjamin Netanyahu. Ouviu e ficou agradado com o pronunciamento incendiário do ministro da Defesa israelense, Israel Katz. Tal ministro prometeu "queimar Teerã", como num surto de Nero, que incendiou Roma.

Para o reverendo Mike Huckabee, embaixador dos EUA em Israel, Trump é um enviado de Deus para resolver o problema nuclear criado pelo Irã.

O presidente americano, então, surfou nas propagandas de guerra. Ele disse:

1) Que a intervenção americana só ocorreria se o Irã atacasse as bases americanas. Também se atingisse os interesses americanos, numa referência a interesses comerciais. Pelo jeito, mencionava o fechamento do estreito de Ormuz (entre Omã e Irã), por onde passa um quarto do petróleo produzido no mundo.

2) "É possível que sejamos envolvidos no conflito". A frase é do último domingo e anuncia uma provável entrada dos EUA no conflito.

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3) Na segunda-feira, aconselhou a evacuação de Teerã, com urgência. Esqueceu-se que é uma cidade de 10 milhões de habitantes. Com isso, criou confusão, pois muitos tentaram sair de Teerã em direção à periferia ou ao interior, com filas nas estradas e espera de mais de cinco horas para abastecer os carros.

4) Na terça, Trump tentou assustar Ali Khamenei: "Sabemos onde se esconde, mas, no momento, não queremos eliminá-lo". Disse, também, ter o controle do espaço aéreo de Teerã.

5) Na quarta, ressaltou que Irã suplica a volta às negociações, mas a condição é uma só, ou seja, o fim do enriquecimento do urânio.

O rei Bibi

Todos os israelenses sabem do envolvimento do Irã, internacionalmente considerado um "estado pária", com o terrorismo.

Também não é segredo em Israel o fato de o Irã manobrar, no seu interesse expansionista, as ações do Hamas, Hezbollah e Houthis. E o premiê Netanyahu usa a imagem da cabeça da serpente quando menciona o Irã — um simbolismo semelhante ao empregado pelo então líder supremo Ruhollah Khomeini ao chamar os EUA de o "Grande Satã".

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Com os ataques ao Irã, o premiê Bibi voltou a reequilibrar-se politicamente, em Israel, depois da ameaça dos dois partidos religiosos da sua coalização.

Num livro de grande utilidade e já traduzido em sete línguas, a historiadora belga Anne Morelli trata da propaganda de guerra. Um dos princípios fundamentais é o de o governante convencer os cidadãos, a todo custo e ainda com informes falsos, sobre seus acertos estratégicos e de estar a vencer.

Israel e Irã usam a propaganda de guerra. Com relação a Netanyahu, por exemplo, já se buscou uma analogia com o imperador persa Ciro (538 a.C.). Ciro conquistou a Babilônia, acabou com o cativeiro imposto aos hebreus, permitiu a volta a Jerusalém e contribuiu para o reerguimento do Templo de Salomão, destruído em Jerusalém por Nabucodonosor.

Para muitos, Bibi Netanyahu, como prometeu, libertará os persas do regime ditatorial dos aiatolás.

Bibi foi contestado pelas iranianas Narges Mohammadi, ganhadora do Nobel da Paz em 2023, e pela pacifista e advogada Shirin Ebadi. Essas duas humanistas fazem oposição ao regime dos aiatolás, mas afastam a falsa propaganda de Bibi, salvador.

Elas mostraram o premiê como um interessado em guerra e derramamentos de sangue de inocentes para se manter no poder em Israel. E frisaram ter o governo Netanyahu bombardeado civis iranianos inocentes. Num resumo, destacaram que aquele que faz o bem não pode bombardear iranianos, vítimas do regime.

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A propagando do rei Bibi não pegou. Imagem fake, ridícula. Mas serviu para alimentar a sua egolatria.

Pano rápido

Trump, com a resposta ao ultimato dada por Khamenei terá, nos próximos dias, de se posicionar. Não tem outra saída.

Pelo menos na retórica, Khamenei topou a briga e afirmou que o Irã não irá "afinar": "Qualquer ataque terá graves e irreparáveis consequências", disse.

Para os 007 da inteligência europeia, nenhum míssil iraniano, pela distância, explodirá nos EUA, mas bases americanas e frotas navais americanas poderão ser atingidas. E o Irã poderá reativar a sua rede de terror, que usa sempre com a "mão do gato".

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** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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