'Jackie Kennedy do Oriente Médio': quem foi a última imperatriz do Irã

Quando a Revolução Islâmica de 1979 depôs o xá Mohammad Reza Pahlavi, a família imperial do Irã deixou o país e procurou exílio em uma série de países. Hoje, a última imperatriz Farah Pahlavi, 86, vive na França e nos EUA após mais de quatro décadas da perda de sua coroa.

A trajetória de Farah

Nascida em Teerã em 1938 ainda como Farah Diba, a matriarca da família imperial era herdeira de uma família abastada. O pai era capitão das Forças Armadas Iranianas e seu avô foi um diplomata do Irã na corte Romanov, da Rússia, no final do século 19. No entanto, a morte do pai quando ela tinha apenas nove anos deixou a família em dificuldades financeiras, segundo sua autobiografia, e eles foram viver com um tio.

Apesar disso, Farah recebeu boa educação. Ela estudou na escola italiana de Teerã e depois nas escolas francesas Jeanne d'Arc e Lycée Razi, o que acabaram levando a jovem à faculdade de arquitetura na École Spéciale d'Architecture, em Paris.

Farah Pahlavi e Mohammad Reza Pahlavi em seu casamento, em 1959
Farah Pahlavi e Mohammad Reza Pahlavi em seu casamento, em 1959 Imagem: Reprodução/FarahPahlavi.org

Foi ainda como estudante que a futura imperatriz conheceria o xá (rei). Durante uma visita de Estado em Paris, o xá foi convidado a uma recepção na Embaixada do Irã na França, onde foi apresentado à jovem. Recém-divorciado de sua segunda esposa devido à infertilidade dela e em busca de uma nova esposa que pudesse lhe dar um herdeiro, Reza Pahlavi logo se interessou por Farah. Meses depois, em dezembro de 1959, os dois se casaram.

Ela logo virou um ícone de estilo no Irã. Seu vestido de noiva foi desenhado por Yves Saint Laurent, então estilista na Dior. Ao longo da década de 1960, ela ainda receberia da imprensa o título de "Jackie Kennedy do Oriente Médio", tanto pela elegância quanto pela veia filantrópica. Em 1967, a então rainha foi coroada novamente, como imperatriz —ou xabanu, em persa.

O xá Mohammad Reza Pahlavi com a imperatriz Farah Pahlavi recebidos pelo presidente dos EUA, John F. Kennedy e pela primeira-dama, Jackie Kennedy, na Casa Branca em 1962
O xá Mohammad Reza Pahlavi com a imperatriz Farah Pahlavi recebidos pelo presidente dos EUA, John F. Kennedy e pela primeira-dama, Jackie Kennedy, na Casa Branca em 1962 Imagem: Domínio Público

Inicialmente, era esperado de Farah apenas que ela desse ao xá seu esperado herdeiro. O casal teve quatro filhos: o príncipe herdeiro Reza Pahlavi (1960), a princesa Farahnaz (1963), o príncipe Ali Reza (1966-2011) e a princesa Leila (1970-2001). Mas ela se tornou influente e acabou reconhecida pelo marido como embaixadora e regente, caso ele não pudesse reinar e seu filho ainda fosse menor.

Mas ela logo se envolveu na agenda cultural do país. Farah promovia eventos como o Festival de Cinema de Teerã, passou a colecionar obras de arte, financiar iniciativas de saúde e a fundar ou apoiar financeiramente instituições educacionais. Uma reportagem da Time de 1974 a chama de "imperatriz trabalhadora" e conta que ela doou suas joias a museus. Os trabalhos beneficentes também a tornaram imensamente popular.

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Farah Pahlavi em visita oficial a Kavir, no Irã, em 1974
Farah Pahlavi em visita oficial a Kavir, no Irã, em 1974 Imagem: Domínio Público

No começo dos anos 1960, estive em muitas galerias de arte, conheci artistas e comprei seus trabalhos. Os ricos do Irã estavam comprando arte iraniana antiga, não o trabalho de artistas modernos. Uma pintora me disse: 'Eu queria que tivéssemos um lugar permanente para deixar nossas obras de arte', e assim nasceu a ideia de construir um museu para artistas iranianos. E por que não obras de arte estrangeiras também, quando o resto do mundo tem arte iraniana em seus museus? Farah Pahlavi ao 'Spiegel' em 2017

E a ex-imperatriz em 2022
E a ex-imperatriz em 2022 Imagem: Reprodução/FarahPahlavi.org

Com a queda do regime do marido, Farah seguiu respeitada mesmo pelos opositores dele. Um aiatolá teria oferecido um retorno seguro ao Irã à ex-imperatriz, sob a condição de que ela matasse o próprio marido primeiro, apontou em 2017 uma reportagem da revista alemã Die Spiegel. Farah rebateu: "Não considero como iranianos essas pessoas. Eles mataram muita gente".

A última imperatriz e o restante da família imperial tiveram dificuldades de encontrar refúgio. Eles passaram por exílios temporários no Egito, Marrocos, Bahamas, México, EUA e Panamá, enquanto a saúde do ex-xá se deteriorava devido a um linfoma não Hodgkin, além de outras comorbidades e complicações. Farah se viu viúva em 1980.

Farah e a família imperial iraniana em 1973
Farah e a família imperial iraniana em 1973 Imagem: Domínio Público
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Com a morte do xá, portas se abriram para um exílio para a ex-imperatriz. Farah foi recebida nos EUA, onde criou os filhos. Ela fixou residência primeiro nos ricos e tradicionais estados de Massachusetts e Connecticut, mas desde a morte da filha em 2001, divide-se entre Washington (pela proximidade com o filho mais velho) e a França —onde é ainda parte ativa da agenda das nobrezas europeias, marcando presença em casamentos como o do príncipe da Dinamarca em 2004, o do príncipe de Mônaco, em 2011, e o do príncipe da Jordânia, em 2023.

Farah Pahlavi e a então primeira-dama dos EUA, Rosalynn Carter, em 1977
Farah Pahlavi e a então primeira-dama dos EUA, Rosalynn Carter, em 1977 Imagem: Domínio Público

No exílio, a ex-imperatriz seguiu com o trabalho de sua organização, a Fundação Xabanu Farah Pahlavi, através da qual se dedica a preservar o patrimônio cultural e histórico do Irã. Seu objetivo é contar a história do país ao mundo um dia, quando o regime dos aiatolás chegar ao fim, segundo ela.

E nos tempos da "bonança" de sua coroação, com o xá Mohammad Reza Pahlavi e o príncipe herdeiro Reza Pahlavi em 1967
E nos tempos da "bonança" de sua coroação, com o xá Mohammad Reza Pahlavi e o príncipe herdeiro Reza Pahlavi em 1967 Imagem: Reprodução/FarahPahlavi.org

Parte de seu acervo, contudo, segue "preso" no seu país de origem. Em 2019, a rede britânica BBC conversou com Farah que contou que uma coleção com obras de Francis Bacon, Alberto Giacometti, René Magritte, Pablo Picasso, Jackson Pollock, Pierre-Auguste Renoir e Mark Rothko amealhada por Farah enquanto era imperatriz segue quase intacta nas abóbadas do Museu de Arte Contemporânea de Teerã, que ela inaugurou em seu aniversário em 1977, com a presença de Nelson Rockefeller. As obras valeriam cerca de US$ 3 bilhões (R$ 16,5 bilhões).

Farah garante que nunca teve a intenção de levá-las consigo em sua fuga. "O que eu comprei foi para o Irã. Não faria sentido tirá-las do país."

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Farah Pahlavi em evento em Washington, em 2016
Farah Pahlavi em evento em Washington, em 2016 Imagem: Ketoni16/Creative Commons

Nos EUA, a ex-xabanu se tornou companhia frequente de primeiras-damas e aristocratas. Ela frequentemente participa de eventos beneficentes e continuou a exercer sua influência: em 2003, escreveu sua autobiografia, "An Enduring Love: My Life With the Shah", e em 2009 se tornou estrela do documentário "The Queen and I".

A ex-imperatriz Farah Pahlavi com o filho, o príncipe herdeiro Reza Pahlevi em 2025
A ex-imperatriz Farah Pahlavi com o filho, o príncipe herdeiro Reza Pahlevi em 2025 Imagem: Reprodução/FarahPahlavi.org

Dois golpes pessoais abalaram Farah nas últimas duas décadas: as mortes de Leila e Ali, ambos por suicídio. "É uma ferida no meu coração que nunca vai sarar. Eles eram ambos tão inteligentes e esforçados, com todos seus problemas", reconheceu ao Spiegel em 2017. Ela atribui a deterioração da saúde mental dos filhos ao que passaram no exílio e admite que também teve depressão, mas procurou tratamento. "Fui a um psicólogo. Tomei remédios por algum tempo, mas depois parei porque eles me faziam me sentir ainda pior. Hoje digo a mim mesma: até o momento resisti."

Recentemente, a ex-imperatriz-socialite "coroou" a neta. Em 6 de junho, ela esteve em Paris para ver Iman, filha do príncipe herdeiro, casar-se com o empresário americano Bradley Sherman. Na cerimônia tradicional, Farah surgiu com um terno coberto por pedras preciosas e passou à neta a tiara usada em seu casamento em 1959, quando se tornou a rainha do Irã. A peça da joalheria americana Harry Winston em ouro e prata com um dos diamantes mais valiosos da história era um símbolo do período de luxo do seu império, segundo a AFP.

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