PB: Justiça suspende obras de prédio de luxo na praia por impasse de altura

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A Justiça da Paraíba suspendeu as obras de um prédio de luxo de sete pavimentos que está sendo construído à beira-mar de Cabedelo, na Grande João Pessoa, até que se chegue a uma conclusão sobre a altura máxima que o empreendimento pode ter naquele local.
O impasse ocorre porque o MP-PB (Ministério Público da Paraíba) alega que a Constituição da Paraíba, de 1989, limita prédios a até 100 metros do mar a altura máxima de 12,9 metros (cerca de quatro pavimentos). Já a prefeitura entende que há erro de interpretação do MP, já que o empreendimento está em área já urbanizada, e o prédio não tem saída para a praia —ou seja, a entrada ficaria a mais de 100 metros.
Em meio ao impasse, a juíza da 4ª Vara Mista de Cabedelo, Teresa Cristina de Lyra Pereira Veloso, determinou nesta terça-feira (30) que a prefeitura suspenda todos os atos administrativos e licenças da obra até que se avalie qual o limite de altura permitido no local.
A obra do "Ares Urban Design", da Urban 04 Construções e Incorporações, está em fase final de fundação (87% feita) e tem apartamentos à venda, a preços iniciais a partir de R$ 1,77 milhão. A previsão inicial de entrega era maio de 2027.
O prédio está sendo erguido na avenida Oceano Atlântico, no bairro Intermares, na orla da cidade litorânea conhecida pelo belo pôr do sol e pelo bolero tocado todos as tardes na praia do Jacaré.

O que alega o MP
A denúncia foi feita ao MP pelo condomínio que fica imediatamente atrás do terreno onde estava sendo feito o empreendimento, que questionou a altura do prédio. Com base nisso, a promotoria de Cabedelo abriu um inquérito para apurar o caso e ingressou com ação civil pública no último dia 12 de junho pedindo o veto à construção do prédio como projetado.
Segundo o MP, o edifício está na "primeira quadra em relação à linha da preamar", descumprimento à lei máxima estadual que "estabelece como altura máxima de edificações nessa faixa o limite de 12,9 metros".
A Constituição da Paraíba determina o limite que prédios com até 100 metros de distância da linha da preamar de sizígia —que é a referência ao nível mais alto que as águas do mar atingem durante a maré alta. Se fosse o caso de estar entre 100,01 e 200 metros, a altura máxima seria de 24,75 metros.
Um prédio residencial de sete andares, segundo padrões da construção civil, tem uma altura de cerca de 21 a 25 metros, já que cada pavimento tem no mínimo 3 metros, além do adicional de altura que normalmente é feito na fundação do prédio.
O MP alega ainda que o prédio está em "desconformidade com o perfil das edificações vizinhas" e argumenta que a Prefeitura de Cabedelo emitiu licença de construção com base em uma lei complementar que burlou à Constituição para permitir alturas superiores. A norma, "é flagrantemente inconstitucional", segundo o promotor Francisco Barros, autor da ação.
Não há dúvidas que o empreendimento descumpriu os limites legais de altura. A edificação objeto da presente demanda viola frontalmente o artigo 229 da Constituição do Estado da Paraíba, dispositivo este que protege a zona costeira como patrimônio ambiental, cultural, paisagístico, histórico e ecológico. A construção, além de contrariar a norma constitucional, compromete a ventilação natural, a paisagem e o ordenamento urbanístico local.
Ação do MP-PB

Prefeitura retruca
À Justiça, o município de Cabedelo alegou que há uma interpretação equivocada do MP, já que a restrição seria para áreas a serem urbanizadas, e cita que o o empreendimento está meio de uma "área urbana consolidada há décadas, com infraestrutura implantada antes mesmo da promulgação da Constituição Estadual de 1989".
Além disso, a prefeitura apresentou "imagens e certidão de uso e ocupação do solo" que apontariam que o lote do empreendimento está inserido no 2º trecho da área urbanizada —e lá a altura máxima seria de 24,75 metros.
A lei complementar 60/2017, segundo consultou o UOL, diz que apenas os "lotes frontais à orla marítima obedecerão ao gabarito de altura previsto para o 1° trecho". "O lote não possui frente para a orla marítima, mas sim para uma área pública do município, afastando as restrições de 'lotes frontais à orla'", alegou a defesa da prefeitura.
Em nota à coluna, a Prefeitura informou que cumprirá a liminar. "Contudo, o corpo técnico da Prefeitura, por meio da Secretaria de Uso e Ocupação do Solo, emitiu parecer que embasou a concessão do alvará de construção, entendendo que o projeto está em conformidade com a legislação vigente".
A gestão municipal reafirma a confiança na competência e seriedade de sua equipe técnica, sempre comprometida com o cumprimento da lei, e reitera seu compromisso com a transparência, o diálogo com os órgãos de controle e o respeito ao interesse público.
Prefeitura de Cabedelo
Em nota, a Urban Construtora diz que recebeu com surpresa a decisão, já que a obra encontra-se na fase de fundação, ainda na primeira laje, sem qualquer pedido de habite-se em tramitação.
Ainda reafirma os argumentos da prefeitura e lembra que todas as licenças "foram obtidas dentro dos critérios técnicos e legais, com base na legislação vigente".
"Nesse contexto, torna-se desnecessária e inoportuna a concessão de liminar diante de mera suposição de eventual descumprimento do gabarito urbanístico da área. A empresa informa que seu departamento jurídico já foi acionado para adotar as medidas cabíveis, com o objetivo de reverter a decisão e garantir a continuidade do empreendimento", afirma.

Justiça vê risco
Ao decidir pela liminar pedida pelo MP, a juíza afirmou que há dúvidas da localização do empreendimento em relação à linha preamar, o que "demanda aprofundamento probatório', com provável "necessidade de perícia técnica para determinar a real situação do empreendimento em relação à linha de preamar de sizígia, aos trechos de escalonamento e à natureza do loteamento (já urbanizado ou a ser urbanizado)".
Ela lembra que a Constituição, com a regra da altura, "busca proteger a zona costeira como patrimônio ambiental, cultural, paisagístico, histórico e ecológico". Por isso, a continuidade das obras em meio a dúvida do gabarito da área poderia "causar impacto irreversível na paisagem, na aeração e na incidência solar, além de gerar um precedente negativo para outras construções irregulares".
A concessão de licença para construção em desacordo com o disposto no art. 229 constitui, inclusive, crime de responsabilidade. A violação de normas urbanísticas e ambientais que visam à proteção da zona costeira, com a preocupação de assegurar beleza paisagística, aeração adequada e incidência solar nas praias, configura um risco iminente de dano ambiental e urbanístico irreparável. A construção, se em desconformidade com o ordenamento urbanístico configura dano coletivo à ordem urbanística.
Juíza Teresa Cristina de Lyra Pereira Veloso
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