CNJ decide punir Marcelo Bretas com aposentadoria compulsória

O CNJ (Conselho Nacional de Justiça) decidiu hoje, por unanimidade, punir o ex-juiz da Lava Jato no Rio Marcelo Bretas, 54, com aposentadoria compulsória do magistrado. O MPF (Ministério Público Federal) havia pedido o afastamento temporário de Bretas.

O que aconteceu

Ações contra Bretas foram julgadas hoje no CNJ. O relator dos processos, conselheiro José Edivaldo Rocha Rotondano, adiantou que votou pela procedência parcial dos três processos disciplinares por irregularidades na atuação do magistrado à frente da Lava Jato no Rio e pediu a aposentadoria compulsória dele, punição mais grave aplicada a um juiz.

12 conselheiros concordaram com o relator em relação à aposentadoria compulsória de Bretas. O corregedor nacional de Justiça, Mauro Campbell, ainda solicitou que seja pedido a Advocacia Geral da União e ao Ministério Público Federal que abra uma ação civil público para que Bretas perca o cargo de juiz.

Com aposentadoria compulsória, Bretas manterá salário proporcional ao tempo de serviço. O cálculo dos vencimentos de um magistrado que recebe este tipo de sanção varia caso a caso. Atualmente, o subsídio de Bretas é de R$ 39.753,21, acrescido por vantagens e penduricalhos que podem fazer o salário ultrapassar o teto constitucional de R$ 46.366,19. Em janeiro deste ano, por exemplo, ele ganhou R$ 19.993,23 em "direitos eventuais", o que faz o salário bruto do magistrado chegar a R$ 61.372,80 naquele mês.

PGR teve entendimento diferente do relator e pediu punição mais branda a Bretas. O subprocurador-geral da República se posicionou pela improcedência de um dos processos e pela procedência parcial dos outros dois, com pena de afastamento de 90 dias em um caso e 60 no outro.

Relator afirmou que Bretas usou de estratégias processuais "espúrias" na condução dos processos da Lava Jato no Rio. Destacou ainda que o magistrado usou a operação para fazer "autopromoção" de sua imagem como alguém que combatia a corrupção.

Rotondano considerou que Bretas fez "concluio" com o advogado Nythalmar Ferreira para negociar penas, além de direcionar alvos e o andamento de processos. A atuação conjunta entre os dois foi denunciada pelo próprio Nythalmar em acordo de delação premiada, que acabou, no entanto, sendo arquivado pelo TRF-2 por falta de provas.

De certo, atestam os elementos de prova que, enquanto as prisões, restituições de valores e delações se apresentavam como supostas entregas eficientes do braço fluminense da Lava Jata, da Lava Jato, internamente, a imparcialidade do julgador e o modelo acusatório cediam espaço a estratégias processuais espúrias

O que se afigura evidente na hipótese é um arranjo orquestrado entre o juiz Marcelo Bretas, o advogado de Nythalmar Ferreira, em alguns casos com procurador da República, que se perfazia em detrimento da paridade de armas e com o objetivo de alcançar projeção e autopromoção.
José Edivaldo Rocha Rotondano, relator dos processos no CNJ

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Pela manhã, ocorreram as sustentações orais de um representante da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), que move duas das ações contra Bretas, e da defesa do juiz. O advogado Delio Lins e Silva, conselheiro federal da OAB, acusou o juiz de "diversas irregularidades" e de atuar por "poder e vaidade".

Defesa diz que não há provas contra Bretas e tratou denúncias como fofocas. A advogada Ana Luísa Volgado de Oliveira pediu que os processos sejam declarados improcedentes e o juiz, absolvido.

'Conjunto amplo de condutas impróprias', diz Barroso

O presidente do CNJ e ministro do STF, Luís Roberto Barroso, repudiou as condutas de Bretas. "Ficou claramente comprovado uma relação imprópria entre o juiz e o advogado Nythalmar em condutas relacionadas a uma exploração de prestígio, bem como um tratamento inusual e a concessão de acesso ilegal a informações sigilosas ao advogado. Esses são dois pontos que chamaram minha atenção."

Contudo, ele afirmou que "nenhum de nós fica feliz" com a punição severa a um juiz. "Portanto, um conjunto muito amplo de condutas impróprias, e totalmente inaceitáveis, para um magistrado."

Me pareceu muito clara, na exposição do conselheiro Rotandano, a prática de atos deliberadamente voltados a interferir no resultado das eleições com uso do papel jurisdicional. Uma atuação claramente parcial ao procurar, na arguição, transformar a testemunha em acusado, com a antecipação da data da audiência para a véspera das eleições para poder produzir impacto sobre o resultado eleitoral.
Luís Roberto Barroso

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O que foi julgado

CNJ julga processos que questionam a atuação de Bretas como braço da Lava Jato no Rio. O magistrado estava afastado das funções desde fevereiro de 2023. Uma das ações foi aberta a partir de representação da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) que acusou o magistrado de barrar acesso a documentos pelas defesas e manipular processos para ficar com a relatoria de ações que deveriam ser julgadas em outras jurisdições.

OAB ainda diz que Bretas é suspeito de "negociar penas, orientar advogados e combinar estratégias com o Ministério Público". A acusação foi feita com base em delação premiada do advogado Nythalmar Dias Filho.

Outro processo foi movido pelo prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (PSD-RJ). Ele acusa Bretas de perseguição com motivação política, em conduta "incompatível com a imparcialidade", para favorecer, em 2018, o então candidato Wilson Witzel na eleição ao governo do Rio. A terceira reclamação foi aberta pelo então corregedor nacional de Justiça, ministro Luís Felipe Salomão, e investiga possíveis irregularidades na prestação de serviços judiciais sob responsabilidade de Bretas.

Desde que foi afastado, Bretas nega qualquer irregularidade. Enquanto esteve à frente da operação, ele condenou 183 das 887 pessoas denunciadas pelos procuradores na Justiça Federal do Rio, segundo dados do MPF (Ministério Público Federal).

Tais condenações, assim como outras da Lava Jato, vem sendo anuladas em instâncias superiores. Isso inclui diferentes sentenças contra o ex-governador do Rio, Sergio Cabral, condenado a mais de 400 anos de prisão.

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A pena máxima que poderia ser aplicada seria advertência ou censura porque nem a disponibilidade (afastamento) a gente entende que seria cabível. E aqui, completamente fora do script, como advogados nesse processo, tendo visto toda a instrução probatória, desde o início até aqui, choca um pouco a aplicação de uma pena tão grave como a aposentadoria compulsória. Porque apenar o magistrado com essa pena é praticamente julgar contra a prova dos autos. Não existe nenhuma prova que indicaria uma conduta tão gravosa.
Ana Luísa Vogado de Oliveira, advogada de Marcelo Bretas

*Com informações da Agência Brasil

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