Acidente nos EUA: família precisa de R$ 610 mil para repatriar brasileiro

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Natural de Mathias Lobato, em Minas Gerais, antes de sair do Brasil, Maxmiller Rodrigues Martins, 37, morava em Governador Valadares (MG) —um dos principais polos de emigração do Brasil para os EUA. E, assim como muitos de seus conterrâneos, decidiu viver o sonho americano.
Com destino a Boston, em Massachusetts, saiu de sua cidade em 2021. Trabalhou por lá até 2022, quando teve a oportunidade de se mudar para Norfolk, no estado da Virgínia, para assumir um emprego como motorista de caminhão. Com visto irregular, Max Cowboy, como era chamado, ainda sim tinha permissão para trabalhar.
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Foi no dia 17 de abril de 2024 que sua vida mudou completamente. Um acidente envolvendo o caminhão em que trabalhava fez com que ele sofresse um traumatismo craniano que o deixou totalmente inconsciente.
'Sem qualquer perspectiva de recuperação'
Max perdeu o controle do caminhão que dirigia após o pneu estourar. "Estourou o pneu do caminhão, ele perdeu o controle e capotou. Só estava ele no acidente. O seguro não apareceu, o dono da empresa sumiu e alega que o Max não trabalhava para ele", conta Valquíria Martins, irmã da vítima, ao UOL.
Conforme reportagem publicada pelo portal de notícias local Wavy: "A Polícia Estadual da Virgínia disse que o veículo bateu pouco antes das 11h quando o motorista perdeu o controle devido a um pneu estourado", diz a nota, publicada no dia do acidente.

Sem seguro saúde, Max ficou 31 dias em coma e até hoje está à mercê do sistema hospitalar norte-americano. "O acidente foi dia 17 de abril. No dia 18 de maio ele acordou", conta Valquíria. Com isso, Max precisou de ventilação mecânica e passou por uma traqueostomia [procedimento cirúrgico que cria uma abertura na traqueia para facilitar a respiração].
Segundo as informações médicas, Max também não está responsivo, ou seja, não demonstra consciência, mesmo tendo acordado do coma. "O que dá para inferir, mesmo sem laudos completos, é que ele sofreu um traumatismo craniano muito grave", afirma o neurocirurgião Maurício Panício, que, a pedido do UOL, analisou o laudo enviado pelo hospital norte-americano.
Quadro neurológico é considerado irreversível. "Não houve fratura, hematoma ou edema cerebral que justificasse cirurgia, mas isso não diminui a seriedade do quadro", explica Panício, que completa: "ele está muito comprometido neurologicamente. Infelizmente, ficou com uma sequela grave".
Uma lesão axonal difusa pode explicar quadro severo. Esse tipo de lesão mais grave costuma ser aquela que atinge os axônios --as conexões entre os neurônios e a medula-- e é o tipo de lesão cerebral mais grave, porque não há cirurgia possível. O tratamento é apenas suporte clínico e reabilitação.
Maurício Panício, neurocirurgião e mestre em neurocirurgia pela Unifesp
Por este motivo, ele acabou sendo transferido para uma clínica de reabilitação, onde permanece em tratamento e sendo alimentado por sonda. "Meu irmão está vivo, mas sem qualquer perspectiva de recuperação nos EUA. Queremos trazê-lo para casa, onde ele possa ser cuidado com dignidade", afirma Valquíria, que, junto com Pacífico Martins --também irmão-- lidera os esforços para sua repatriação.
Maximiller Martins é visto a pedido do serviço social, pois eles estão solicitando avaliação para paciente candidato a transporte médico de volta ao seu país de origem, o Brasil. O paciente continua dependente do colar traqueal. Ele é minimamente responsivo e não segue comandos. Além disso, teve perda de peso significativa e tem um ferimento na nádega direita que está sendo monitorado.
Trecho do laudo médico divulgado pelo Waterside Health & Centro de Reabilitação, onde Maxmiller está internado
O estado de saúde de Max é assustador para a família, que sempre o viu como um homem forte e muito ativo. "Ele gosta de dançar. Não é aquele cara instruído, mas ele é aquele cara que chega em qualquer lugar e sabe se sair, porque ele faz amizade muito rápido. Então, se ele chega num lugar que está silencioso, acabou o silêncio. Ele mesmo se rotula como o bruto, o rústico e o sistemático", lembra a irmã.
Família busca repatriação
A volta de Max ao Brasil, no entanto, é um desafio logístico e financeiro: o orçamento estimado para o traslado gira em torno de R$ 610 mil. A família tentou acionar o governo brasileiro, mas não obteve resposta efetiva. O transporte de um paciente no estado em que ele está exige uma UTI aérea, com equipe médica especializada e equipamentos apropriados.
Entramos em contato com o Itamaraty e com o consulado, mas até agora nada foi resolvido. Estamos sozinhos nessa luta.
Valquíria Martins
Diante do impasse, os irmãos de Max decidiram lançar uma campanha de arrecadação online. A vaquinha virtual tem o objetivo de arrecadar fundos para custear o transporte. Amigos, conhecidos e até desconhecidos têm contribuído, com doações e divulgação nas redes sociais. Além disso, brasileiros que vivem nos EUA também se mobilizaram, organizando rifas e eventos solidários para ajudar na causa.
Muita gente vai embora achando que a vida vai melhorar, mas ninguém se prepara para um acidente como esse.
Pacífico Martins
Do ponto de vista médico, Max pode ser transportado ao Brasil. O médico considera o transporte viável, desde que o paciente esteja estável. "Se ele estiver com pressão arterial e função cardíaca normais, sem necessidade de drogas para manter isso, ele pode ser transportado", explica o neurocirurgião.
De acordo com o advogado da família, Isaac Pessamilio, existem provas suficientes do vínculo empregatício de Max com a empresa em que prestava serviço. E para a responsabilização do empresário que o contratou, é preciso autorização da vítima.
Com isso, sua tutora legal, que foi designada pelo governo dos Estados Unidos, seria a pessoa indicada para obter a procuração em nome dele. Mas a família alega encontrar dificuldades para manter contato com ela e diz que não recebe respostas concretas há mais de dois meses.
Ele está lá sozinho. A gente não tem contato direto com o médico. Tudo que sabemos é pelo que a tutora americana passa por WhatsApp. E mesmo assim, é tudo superficial. Ela [a tutora] diz que está doente e que vai passar o caso de Max para outra pessoa, mas até agora nada foi resolvido.
Valquíria Martins
A irmã até tentou ir para os Estados Unidos no ano passado, mas não conseguiu visto. "Fui para uma agência aqui, levei toda a papelada. Só que, quando cheguei lá, fizeram só três perguntas, estava com tudo na pasta, um laudo na pasta. Tinha foto dele, algumas coisas para comprovar todas as informações que estavam solicitando. Porém, em três perguntinhas, a mulher falou: 'não, você não está qualificado para o país'", conta Valquíria.
O que dizem as autoridades
Ao UOL, o Itamaraty, por meio do consulado-geral do Brasil em Washington, diz que acompanha o caso desde maio de 2024, quando foi notificado a respeito. "Desde então, tem permanecido em contato com a família, a quem tem prestado assistência consular (inclusive no que tange à orientação jurídica perante a Justiça local e à informação quanto aos trâmites legais para solicitação de repatriação), e com as autoridades locais responsáveis pelo acompanhamento do caso", diz o órgão, em nota.
O Itamaraty também diz que não custeia voos especiais. Como Max necessita de uma UTI aérea, o Itamaraty explica que "ficaria a cargo da família".
"Socorro, mãe"
Enquanto a arrecadação avança —até então com cerca de R$ 300 mil arrecadados—, os irmãos se revezam entre a esperança e a frustração. O caso de Max evidencia as dificuldades enfrentadas por imigrantes em situação de vulnerabilidade, especialmente quando não há redes de proteção formais.
De acordo com Panício, não há impeditivos médicos para que Max volte ao Brasil, mas não deve-se abrir mão do transporte específico. "Existem UTIs aéreas capazes de transportar até pacientes intubados. O problema, nesse caso, é o custo, não a contraindicação médica", diz o médico.
Gostaria mesmo é de poder trazer meu filho para casa para que a gente cuide dele. Sinto quando ele olha para gente com um olhar triste, tipo de 'eu estou aqui sozinho. Socorro, mãe', e a gente não pode estar lá presente.
Suely Martins, mãe do Max
Nas redes sociais, a família pede ajuda e continua na luta para responsabilizar a empresa que contratou Max. "Não é justo que um brasileiro fique preso num sistema sem assistência e sem dignidade. O Max precisa voltar, precisa estar perto de quem o ama", diz Valquíria.
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