Jamil Chade

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Reportagem

Trump joga EUA em escalada militar global e ignora promessa de campanha

A decisão de Donald Trump de abandonar uma de suas principais bandeiras de campanha eleitoral e lançar os EUA numa nova guerra no Oriente Médio foi recebida com temor por parte da comunidade internacional. Diplomatas americanos e estrangeiros agora apontam para um risco imediato de uma escalada inédita da crise na região e no cenário global.

"A intensificação e a disseminação de grandes operações militares no Oriente Médio ameaçam mergulhar a região - e o mundo - em uma guerra com consequências irreversíveis", disse a presidente do Comitê Internacional da Cruz Vermelha, Mirjana Spoljaric.

Na noite de sábado, o presidente americano anunciou os ataques contra as instalações nucleares iranianas e deixou a porta aberta para novas ofensivas, caso os iranianos se recusem a negociar. O acordo proposto por Trump envolve a "completa rendição" do governo em Teerã e de seu programa nuclear.

A comunidade diplomática adotou uma postura radicalmente diferente ao tom de triunfo de Trump. Na ONU, o secretário-geral, António Guterres, chamou o ato americano de uma "escalada perigosa". A mesma postura de alerta foi adotada pelo Qatar, um ator central na região.

Aliados na Otan, como França e Reino Unido, foram alertados momentos antes de os ataques ocorrerem.

Ainda na noite de sábado, as missões diplomáticas em Nova York passaram a ganhar proteção extra, diante do risco de que iranianos optem por atentados em solo americano. No Iraque, o Kataib Hezbollah, grupo terrorista apoiado pelo Irã, anunciou que seus militantes retomariam atentados contra americanos.

O envio de dois aviões B-2 foi o ato mais crítico da política externa de Trump desde que tomou posse.

Para o regime iraniano, o ataque terá "consequências eternas" aos americanos. "A guerra está começando para nós", afirmou a Guarda Revolucionária, o principal pilar do poder em Teerã.

Horas depois do anúncio de Trump, o regime no país persa lançou mísseis sobre Israel, fazendo 16 feridos.

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Na TV iraniana, a promessa foi de que a retaliação virá e o regime de Khamenei apresentou um mapa do alcance dos mísseis do país contra 20 bases americanas. Cerca de 40 mil soldados americanos estão espalhados por diversas bases americanas na região.

A resposta ainda veio do ministro das Relações Exteriores do Irã, Abbas Araghchi, que afirmou que, agora, tem o direito legítimo de responder aos ataques dos EUA às suas instalações nucleares. "O Irã se reserva todas as opções para defender sua soberania, seus interesses e seu povo", alertou.

Pedindo uma reunião urgente do Conselho de Segurança, ele acusou os EUA de violar a carta das Nações Unidas, a lei internacional e o Tratado de Não Proliferação ao atacar as instalações nucleares do Irã. "Os eventos desta manhã são ultrajantes e terão consequências eternas. Todos os membros da ONU devem ficar alarmados com esse comportamento extremamente perigoso, ilegal e criminoso", disse.

O Ministério das Relações Exteriores de Omã, que vinha atuando como mediador nas negociações nucleares entre os Estados Unidos e o Irã, também criticou o ato e alertou para suas consequências. O governo classificou o ataque americano como uma "grave violação da lei internacional".

As ameaçadas também vieram dos houthis, que controlam parte do Iêmen. Os militantes alertaram que estavam "preparados para atacar navios e embarcações americanas no Mar Vermelho, defendendo sua segurança".

Temor nos EUA

Dentro do governo americano, o temor é de que isso mergulhe os EUA em mais uma guerra sem fim, como ocorreu no Iraque ou Afeganistão. Por enquanto, a mensagem é de que o programa nuclear não pode existir.

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Mas existem dúvidas se o objetivo final é apenas a operação atômica do Irã ou se a ofensiva apenas irá parar quando houver uma queda do regime.

Na sexta-feira, Trump insistiu que não era hora de um cessar-fogo e que era muito difícil parar Israel quando os resultados estavam sendo "positivos". Foi a senha de que ele estava pensando em agir. O ataque do sábado ainda confirma reportagens de que os planos militares sobre o Irã já eram uma realidade, mesmo quando Trump disse que daria duas semanas para tomar uma decisão.

O republicano usou como bandeira em sua campanha eleitoral em 2024 que não envolveria os EUA em novos conflitos, criticou os democratas por optarem por guerras pelo mundo e insistiu que, no poder, iria anunciar "imediatamente" acordos de paz em Gaza e na Ucrânia. Cinco meses depois, nenhum acordo foi obtido e, agora, uma nova frente de batalha é lançada.

Na esperança de não romper com sua base, Trump não sinaliza que enviará tropas. Mas os ataques significam que os EUA estão em guerra. Um levantamento do próprio Pentágono indiciou que os americanos precisariam de 30 dias de uma ofensiva militar para neutralizar o programa nuclear iraniano, e não apenas três bombas.

Entre os assessores de Trump, o temor é de como seria a reação do presidente se a retaliação iraniana envolver um importante número de americanos mortos.

Já internamente nos EUA, o ataque militar de Trump com apenas cinco meses de governo causou indignação dos democratas. Para o deputado Jim Himes, cabe ao Congresso autorizar um presidente americano a levar os EUA a um conflito internacional, o que não ocorreu.

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Para o senador Bernie Sanders, os ataques foram "ilegais e inconstitucionais".

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